quinta-feira, 29 de maio de 2008

Aceitarás?


Aceitarás o amor como eu o encaro ?...
Azul bem leve, um nimbo, suavemente
Guarda-te a imagem, como um anteparo
Contra estes móveis de banal presente.
Tudo o que há de melhor e de mais raro
Vive em teu corpo nu de adolescente
A perna assim jogada e o braço, o claro
Olhar preso no meu, perdidamente.
Não exijas mais nada.
Não desejo
Também mais nada, só te olhar, enquanto
A realidade é simples, e isto apenas.
Que grandeza... a evasão total do peito
Que nasce das imperfeições.
O encanto
Que nasce das adorações serenas.
(Mário de Andrade)

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Volta prá casa, fica comigo ...

Modelo - Aldemir Martins

"Tenho pensado muito na vida
Volta bandida mata essa dor
Volta pra casa, fica comigo
Eu te perdôo com raiva e amor
Chega mais perto, moço bonito
Chega mais perto meu raio de sol
A minha casa é um escuro deserto
Mas com você ela é cheia de sol
Molha a tua boca na minha boca
A tua boca é meu doce é meu sal
Mas quem sou eu nesta vida tão louca?
Mais um palhaço no teu carnaval
Casa de sombra vida de monge
Quanta cachaça na minha dor
Volta pra casa, fica comigo
Vem que eu te espero tremendo de amor... "
(trecho de "Gabriela" - Tom Jobim)

domingo, 25 de maio de 2008

Alguns abraços



Preciso de alguns abraços,
aqueles sinceros, de amigo
que me queira muito.
Abraços que acalentem
os sonhos que ainda possuo.
Aqueles que possam dar-me
desejo de prosseguir.
Aqueles que com toques,
despertem meus sentimentos,
façam-me voltar
a ser uma mulher doce,
a fêmea, a amante
amorosa e destemida,
como as dos contos quixotescos
de Lancelot e Güinevère
Napoleão e Josefina...
(Marlene A A Reis)

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Gata todo dia


Eu sou uma gata
E não gosto de água fria
Pega logo no meu pelo
Seu carinho me arrepia
Não quero água
Tomo banho é de lambida
Tiro o gosto desse corpo
E ainda tenho sete vidas
Então se toque
Porque o amor não é
Só distração
A vida arranha
E se eu faço rock
Eu faço manha
Meu bem me dê sua atenção
Não faço nada
E ainda morro de preguiça
Tenho sono o dia inteiro
Madrugada é que me atiça
Não tenho dono
Mando na minha cabeça
Um dia desses eu me mando
Enquanto isso não se esqueça
Tome cuidado
Porque o amor não é
Só distração
A vida arranha
E se eu faço rock
Eu faço manha
Meu bem me dê sua atenção ...
(Léo Jaime/Tavinho Paes e Marina Lima)

terça-feira, 20 de maio de 2008

Com encantos vieste ...


Vieste
Na hora exata,
com ares de festa
E luas de prata...
Vieste
Com encantos, vieste,
com beijos silvestres
Colhidos pra mim...
Vieste
Com a Natureza,
com as mãos camponesas
Plantadas em mim...
Vieste
Com a cara e a coragem,
com malas, viagens
Pra dentro de mim, meu amor...
Vieste
À hora e a tempo,
soltando meus barcos
E velas ao vento...
Vieste
Me dando alento,
me olhando por dentro
Velando por mim...
Vieste
De olhos fechados,
num dia marcado
Sagrado pra mim...
Vieste
Com a cara e a coragem,
com malas, viagens
Pra dentro de mim, meu amor...
(Ivan Lins/Vitor Martins)

Bolero Blues

Quando eu ainda estava moço
Algum pressentimento
Me trazia volta e meia
Por aqui
Talvez à espera da garota
Que naquele tempo
Andava longe,muito longe
De existir
Tantos tristes fados eu compus
Quanto choro em vão,bolero blues
Eis que do nada ela aparece
Com o vestido ao vento
Já tão desejada
Que não cabe em si
Neste crucial momento
Neste cruzamento
Se ela olhar para trás
É bem capaz de num lamento
Acudir ao meu olhar mendigo
Mas aquela ingrata corre
E a Barão da Torre e a Vinícius de Moraes
São de repente estranhas ruas
Sem o seu vestido ficam nuas
E ao vento eu digo-tarde demais
Quando ela já não mais garota
Der a meia-volta
Claro que não vou estar mais nem aí

Mesmo que os cantores sejam falsos como eu
Serão bonitas, não importa
São bonitas as canções
Mesmo miseráveis os poetas
Os seus versos serão bons
Mesmo porque as notas eram surdas
Quando um deus sonso e ladrão
Fez das tripas a primeira lira
Que animou todos os sons
E daí nasceram as baladas
E os arroubos de bandidos como eu
Cantando assim:Você nasceu para mim
Você nasceu para mim
Mesmo que você feche os ouvidos
E as janelas do vestido
Minha musa vai cair em tentação
Mesmo porque estou falando grego
Com sua imaginação
Mesmo que você fuja de mim
Por labirintos e alçapões
Saiba que os poetas como os cegos
Podem ver na escuridão
E eis que, menos sábios do que antes
Os seus lábios ofegantes
Hão de se entregar assim:
Me leve até o fim
Me leve até o fim
Mesmo que os romances sejam falsos como o nosso
São bonitas, não importa
São bonitas as canções
Mesmo sendo errados os amantes
Seus amores serão bons
(Chico Buarque/Jorge Helder)

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Não vou voar não ...

Pode quebrar,
sofrer, cair, descer,
contorcer de dor
Não vou mais me prender a você ,
fazer o mesmo show
Vou bater na porta da vida ,
receber e pagar
Sem ter que me entregar a ninguém ,
seu muito pra mim
É pouco
eu quero a paz e viver solto
Vai dizer que sou louco...
sou não
Eu me cansei de ser seu avião
não vou voar não
(Djavan)

sábado, 17 de maio de 2008

Tô esperando pra ver se você vem


Tava esperando um telefonema seu
Tava precisando de uma voz no ouvido
Tava imaginando teu olhar mirando o meu
Tava desejando um beijo em teu umbigo
Tá legal, falei o que não devia
Me dei mal, amanheceu um novo dia,
Já esqueci, pensei em ti decidi:
Tô aqui esperando pra ver se você vem.
Deixa de lado essa tristeza.
Beija e afasta esse tormento
Deita nesse amor desarrumado
Chega de perder tanto tempo
(Voz no Ouvido - Jair Oliveira)

Eu Te Amo


Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei de partir
Se, ao te conhecer, dei pra sonhar, fiz tantos desvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que inda posso ir
Se nós, nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir
Se entornaste a nossa sorte pelo chão
Se na bagunça do teu coração
Meu sangue errou de veia e se perdeu
Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E o meu sapato inda pisa no teu
Como, se nos amamos feito dois pagãos
Teus seios inda estão nas minhas mãos
Me explica com que cara eu vou sair
Não, acho que estás te fazendo de tonta
Te dei meus olhos pra tomares conta
Agora conta como hei de partir.
(Tom Jobim/Chico Buarque)

Ainda tem o seu perfume


Entre por essa porta agora
e diga que me adora
Você tem meia hora
pra mudar a minha vida
Vem vambora
que o que você demora
é o que o tempo leva
Ainda tem o seu perfume pela casa
ainda tem você na sala
porque meu coração dispara
quando tem o seu cheiro
dentro de um livro“ Dentro da noite veloz”
Ainda tem o seu perfume pela casa
ainda tem você na sala
porque meu coração dispara
quando tem o seu cheiro
dentro de um livro
na “Cinza das horas”
(Adriana Calcanhotto)

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Vermelho


Quero escrever o borrão vermelho de sangue
com as gotas e coágulos pingando
de dentro para dentro.
Quero escrever amarelo-ouro
com raios de translucidez.
Que não me entendam pouco-se-me-dá.
Nada tenho a perder.
Jogo tudo na violência
que sempre me povoou,
ogrito áspero e agudo e prolongado,
o grito que eu,
por falso respeito humano,não dei.
Mas aqui vai o meu berro
me rasgando as profundas entranhas
de onde brota o estertor ambicionado.
Quero abarcar o mundo
com o terremoto causado pelo grito.
O clímax de minha vida será a morte.
Quero escrever noções
sem o uso abusivo da palavra.
Só me resta ficar nua:nada tenho mais a perder.
(Clarice Lispector)

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Suas palavras ...

Eu queria trazer-te uns versos muito lindos
colhidos no mais íntimo de mim...
Suas palavras
seriam as mais simples do mundo,
porém não sei que luz as iluminaria
que terias de fechar teus olhos para as ouvir...
Sim! Uma luz que viria de dentro delas,
como essa que acende inesperadas cores
nas lanternas chinesas de papel!
Trago-te palavras, apenas...
e que estão escritas
do lado de fora do papel...
Não sei, eu nunca soube o que dizer-te
e este poema vai morrendo,
ardente e puro, ao vento
da Poesia...
como
uma pobre lanterna que incendiou!
(Mário Quintana)

Vida louca

Vida louca vida
Vida breve
Já que eu não posso te levar
Quero que você me leve
Vida louca vida
Vida imensa
Ninguém vai nos perdoar
Nosso crime não compensa
Se ninguém olha quando você passa
você logo acha "Eu to carente''
Eu sou "manchete popular"
Tô cansado de tanta babaquice, tanta caretice
Desta eterna falta do que falar
Se ninguém olha quando você passa
você logo acha que a vida voltou ao normal
Aquela vida sem sentido, volta sem perigo
É a mesma vida sempre igual
Se niguém olha quando você passa
você logo diz "Palhaço"
Você acha que não tá legal
Corre todos os perigos, perde os sentidos
Você passa mal
Vida louca vida
Vida breve
Já que eu não posso te levar
Quero que você me leve
Vida louca vida
Vida imensa
Ninguém vai nos perdoar
Nosso crime não compensa
(Lobão/Bernardo Vilhena)

Preciso me encontrar


Deixe-me ir
Preciso andar
Vou por aí a procurar
Rir prá não chorar...
Quero assistir ao sol nascer
Ver as águas dos rios correr
Ouvir os pássaros cantar
Eu quero nascer
Quero viver...
Deixe-me ir
Preciso andar
Vou por aí a procurar
Rir prá não chorar...
Se alguém por mim perguntar
Diga que eu só vou voltar
Depois que me encontrar...
(Candeia)

Conheci os céus pelos olhos seus

Eu, prisioneiro meu
Descobri no breu
Uma constelação
Céus
Conheci os céus
Pelos olhos seus
Véu de contemplação
Deus condenado eu fui
A forjar o amor
No aço do rancor
E assim transpor as leis
Mesquinhas dos mortais
Vou
Entre a redenção
E o esplendor de por você viver
Sim
Quis sair de mim
Esquecer quem sou
E respirar por ti
E assim transpor as leis
Mesquinhas dos mortais
Agoniza
Virgem fênix o amor
Entre cinzas arco-íris e esplendor
Por viver as juras de satisfazer
O ego mortal
Coisa pequenina
Centelha divina
Renascer das cinzas
Onde foi ruína
Pássaro ferido
Hoje é paraíso
Luz da minha vida
Pedra de alquimia
Tudo que eu queria
Renascer das cinzas
Quando o frio vem aquecer o coração
Quando a noite faz nascer
A luz da escuridão
E a dor revela a mais esplêndida
Emoção
O amor
(Flávio Venturini/Jorge Vercilo)

E eu vou lembrar você...


Não vou viver, como alguém que só espera um novo amor
Há outras coisas no caminho aonde eu vou
As vezes ando só, trocando passos com a solidão
Momentos que são meus e que não abro mão
Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora
Vou deixar a rua me levar
Ver a cidade se acender
A lua vai banhar esse lugar
E eu vou lembrar você
É... mas tenho ainda muita coisa pra arrumar
Promessas que me fiz e que ainda não cumpri
Palavras me aguardam o tempo exato pra falar
Coisas minhas, talvez você nem queira ouvir
Já sei olhar o rio por onde a vida passa
Sem me precipitar e nem perder a hora
Escuto no silêncio que há em mim e basta
Outro tempo começou pra mim agora
Vou deixar a rua me levar
Ver a cidade se acender
A lua vai banhar esse lugar
E eu vou lembrar você...
(Ana Carolina/Totonho Villeroy)

De um jeito que não sai


Teu sabor, teu aroma
tuas digitais
tudo teu, me tocou de um jeito que não sai
me invadiu, se instalou
só sei que esse amorf
az de mim, o que quer
gosto assim como é
é igual ao cigano
sempre tão fulgás
conseguiu me prender
de um jeito que nao sai
disfarçar, se conter nao cabe na paixão
só tocar tua tês e te amar outra vez
por favor escuta quem te adoras
em você o que eu seria agora?
(Ivan Lins/Vítor Martins)

terça-feira, 13 de maio de 2008

Quero ...

Tela - A Saxofonista - Claudyo Casares



Quero ver o sol atrás do muro
Quero um refúgio que seja seguro
Uma nuvem branca sem pó, nem fumaça
Quero um mundo feito sem porta ou vidraça
Quero uma estrada que leve à verdade
Quero a floresta em lugar da cidade
Uma estrela pura de ar respirável
Quero um lago limpo de água potável
Quero voar de mãos dadas com você
Ganhar o espaço em bolhas de sabão
Escorregar pelas cachoeiras
Pintar o mundo de arco-íris
Quero rodar nas asas do girassol
Fazer cristais com gotas de orvalho
Cobrir de flores campos de aço
Beijar de leve a face da lua...

(Thomas Roth)

Amar

Foto: by Foguinho


Que pode uma criatura senão, entre criaturas, amar? Amar e esquecer ,amar e malamar, amar, desamar, amar? Sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso, sozinho, em rotação universal, senão rodar também, e amar?Amar o que o mar traz à praia, e o que ele sepulta, e o que, na brisa marinha, é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia? Amar solenemente as palmas do deserto, o que é entrega ou adoração expectante, e amar o inóspito, o áspero, um vaso sem flor, um chão de ferro, e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina. Este o nosso destino: amor sem conta, distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas, doação ilimitada a uma completa ingratidão, e na concha vazia do amor a procura medrosa, paciente, de mais e mais amor. Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.

(Carlos Drummond)

Por não estarem distraídos ...

Foto: by Foguinho



Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos, a alegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que, por admiração, se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles. Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria peso à levíssima embriaguez que era a alegria da sede deles. Por causa de carros e pessoas, às vezes eles se tocavam, e ao toque - a sede é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras - e ao toque brilhava o brilho da água deles, a boca ficando um pouco mais seca de admiração. Como eles admiravam estarem juntos! Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não vira, ela que, estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham prestado atenção, só porque não estavam bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos.

(Clarice Lispector)

Serenata


Permita que eu feche os meus olhos,
pois é muito longe e tão tarde!
Pensei que era apenas demora,
e cantando pus-me a esperar-te.
Permite que agora emudeça:
que me conforme em ser sozinha.
Há uma doce luz no silencio,
e a dor é de origem divina.
Permite que eu volte o meu rosto
para um céu maior que este mundo,
e aprenda a ser dócil no sonho
como as estrelas no seu rumo.
(Cecília Meireles)

sábado, 10 de maio de 2008

Os Três Mal-Amados ...

O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato.
O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço.
O amor comeu meus cartões de visita.
O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.
O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas.
O amor comeu metros e metros de gravatas.
O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus.
O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos.
O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas.
Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X.
Comeu meus testes mentais, meus exames de urina.
O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia.
Comeu em meus livros de prosa as citações em verso.
Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos.
Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete.
Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina.
O amor comeu as frutas postas sobre a mesa.
Bebeu a água dos copos e das quartinhas.
Comeu o pão de propósito escondido.
Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.
O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.
O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas.
O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras.
Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel.
O amor comeu meu Estado e minha cidade.
Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré.
Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia.
Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso.
O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas.
Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam.
Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta.
Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.
O amor comeu minha paz e minha guerra.
Meu dia e minha noite.
Meu inverno e meu verão.
Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.
(João Cabral de Melo Neto)

Para Ana Luiza...


Ou se tem chuva e não se tem sol
ou se tem sol e não se tem chuva!
Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!
Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.
É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo em dois lugares!
Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.
Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo . . .
e vivo escolhendo o dia inteiro!
Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.
Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.
(Cecília Meireles)

sexta-feira, 9 de maio de 2008

Só eu sei ...



Só eu sei
As esquinas
Por que passei
Só eu sei
Sabe lá
O que é não ter
E ter que ter pra dar
Sabe lá
E quem será
Nos arredores do amor
Que vai saber separar
Que o dia nasceu?
Só eu sei
Os desertos
Que atravessei
Só eu sei
Sabe lá
O que é morrer de sede
Em frente ao mar
Sabe lá
E quem será
Na correnteza do amor
Que vai saber se guiar?
A nave em breve
Ao vento vaga
De leve e traz
Toda paz
Que um dia
O desejo levou ...
(Djavan)

Fala me de amor ...

Tela: Manteau Rouge - Tarsila do Amaral


Tu ris, tu mens trop
Tu pleures, tu meurs trop
Tu as le tropique
Dans le sang et sur la peau
Geme de loucura e de torpor
Já é madrugada
Acorda, acorda, acorda, acorda, acorda
Mata-me de rir
Fala-me de amor
Songes et mensonges
Sei de longe e sei de cor
Geme de prazer e de pavor
Já é madrugada
Acorda, acorda, acorda, acorda, acorda
Vem molhar meu colo
Vou te consolar
Vem, mulato mole
Dançar dans mes bras
Vem, moleque me dizer
Onde é que está
Ton soleil, ta braise
Quem me enfeitiçou
O mar, marée, bateau
Tu as le parfum
De la cachaça e de suor
Geme de preguiça e de calor
Já é madrugada
Acorda, acorda, acorda, acorda, acorda
(Chico Buarque)

Resposta ao tempo




Batidas na porta da frente
É o tempo
Eu bebo um pouquinho
Prá ter argumento
Mas fico sem jeito
Calado, ele ri
Ele zomba
Do quanto eu chorei
Porque sabe passar
E eu não sei
Num dia azul de verão
Sinto o vento
Há folhas no meu coração
É o tempo
Recordo um amor que perdi
Ele ri
Diz que somos iguais
Se eu notei
Pois não sabe ficar
E eu também não sei
E gira em volta de mim
Sussurra que apaga os caminhos
Que amores terminam no escuro
Sozinhos
Respondo que ele aprisiona
Eu liberto
Que ele adormece as paixões
Eu desperto
E o tempo se rói
Com inveja de mim
Me vigia querendo aprender
Como eu morro de amor
Prá tentar reviver
No fundo é uma eterna criança
Que não soube amadurecer
Eu posso, ele não vai poder
Me esquecer
(Aldir Blanc/Cristovão Bastos)

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Livre prá Viver

Foto: Sebastião Salgado


Viver é bom demais
Ninguém vai me prender
Eu não me escravizei,
Nem em entreguei a você.
Sou livre para amar,
Louco pra viver esse amor.
Sou livre pra voar,
Não me importa o céu azul,
ou blue.
Sou livre pra pensar,
Eu não devo nada a ninguém,
E a liberdade, é tudo que sonhei,
Eu vou viver, eu juro.
(Claudio Zoli/Bernardo Vilhena)

Um girassol da cor do seu cabelo


Vento solar, estrelas do mar
A terra azul da cor do seu vestido
Vento solar, estrelas do mar
Você ainda quer morar comigo?
Se eu cantar não chore não
É só poesia
Eu só preciso ter você
Por mais um dia
Ainda gosto de dançar
Bom dia
Como vai você?
Sol, girassol, vejo o vento solar
Você ainda quer morar comigo?
Vento solar estrelas do mar
Um girassol da cor de seu cabelo
Se eu morrer não chore não
É só a lua
É seu vestido cor de mar
É filha lua
Ainda moro nesta mesma rua
Como vai você?
Você vem?
Ou será que já é tarde demais?
Se eu cantar não chore não
É só poesia
Eu só preciso ter você
Por mais um dia
Ainda gosto de dançar
Bom dia
Como vai você?
Você vem?
Será que é tarde demais?
O meu pensamento tem a cor de seu vestido
como um girassol que tem a cor de seu cabelo
(Lô Borges)

Teu sonho não acabou ...

Tela: Osmar Oliveira Lima

Hoje a minha pele já não tem cor
Vivo a minha vida seja onde for
Hoje entrei na dança e não vou sair
Vem que eu sou criança não sei fingir
Eu preciso, eu preciso de você
Ah!
Eu preciso, eu preciso, eu preciso muito de você
Lá onde eu estive o sonho acabou
Cá onde eu te encontro só começou
Lá colhi uma estrela pra te trazer
Bebe o brilho dela até entender
Que eu preciso...
Só feche o seu livro quem já aprendeu
Só peça outro amor quem já deu o seu
Quem não soube a sombra, não sabe a luz
Vem não perde o amor de quem te conduz
Eu preciso...
Nós precisamos, precisamos sim
Você de mim, eu de você.
(Taiguara)

quarta-feira, 7 de maio de 2008

O Violinista


Violino: Marcos Boi /Foto:Edeson Souza /Arte: Ly Ferraz


Clara olhava-o com insistência através do grosso vidro à prova de som que separava as salas de aula. De sua cadeira no canto direito no fundo da classe, mal escutava o que a professora de música dissertava, naquela maçante aula teórica. Gostava apenas de tocar. Não tinha paciência para as partituras. Tocava meio que por intuição musical. E principalmente por amor.
Talvez por isso ele tenha lhe chamado a atenção. Era violinista. E tocava de olhos fechados, sem mirar por um instante sequer a partitura aberta à sua frente. As pálpebras sobre os olhos cerrados se movimentavam em compasso e harmonia, as mãos enormes e morenas tinham uma delicadeza sem cabimento por parecerem tão viris aos olhos da menina. Mãos que seguravam o instrumento com a suavidade que ela imaginava-o segurando os seus quadris, em seus devaneios constantes desde que o vira pela primeira vez na escola de música.
Observava sua boca carnuda, que permanecia entreaberta, os músculos tesos da face, onde apoiava o violino, o cabelo castanho desalinhado, que comprido tocava os ombros levemente, a curva do braço em arco, onde se via a penugem clara e as veias azuladas. Tudo naquele homem era movimento, poesia e música. Tudo naquele homem fazia Clara desmanchar-se.
Desde que o viu começou a ter um prazer indescritível em freqüentar as aulas teóricas. Duas vezes por semana. Descobriu aquela cadeira no fundo da classe e há meses só se sentava nela, chegando a ponto de estar presente meia hora mais cedo para que tivesse seu lugar garantido em seu camarote na sala lotada.
E dali se perdia. Conhecia cada poro de seu objeto de desejo, cada gesto, cada mecha de seu cabelo, cada movimentar de sua boca. Inebriada de sonhos e desejos os cinqüenta minutos de aula voavam.
Sua aula terminava mais cedo que a dele. Por isso nunca o encontrava nos corredores, ou nas portas das classes. A visão que tinha dele era apenas a emoldurada pelo grosso vidro quadrado, que separava o sonho do real, suas mãos da pele dele. Um quadro onde ele, móvel e lindo, habitava.
Por meses chegava em casa depois de observa-lo sentindo o corpo em fogo. Demorava no banho, a água quente descendo convidativa pelo seu corpo e imaginava cenas absolutamente impublicáveis entre os dois. Desejo. Paixão. As mãos enormes agarrando seu corpo. O braço forte em arco, porém agora, no lugar do violino, sua cintura. Movimentos suaves, bruscos, rítmicos, frenéticos, até que um tempo depois, junto com o gozo, surgia em sua mente as notas doídas do violino. Ela se desmanchando, jogada no chão do box, entre soluços e gemidos solitários, juntando os cacos de seus delírios.
Sua vida ultimamente se resumia ao prazer daqueles cinqüenta minutos olhando o deus. Antes de entrar na aula seu coração disparava, as mãos suavam frio, sua boca tremia. Sentia-se uma noiva entrando na nave da igreja, tamanha sua ansiedade descontrolada. Obsessão seria a palavra correta. Mas ela não sabia disso. Julgava ama-lo.
Sempre foi muito tímida, caseira e pudica. Praticamente virgem, se não fosse pela sua primeira vez desastrada com seu primeiro e único namorado, um menino magro, de aparelho nos dentes e óculos de aros grossos, alguns anos atrás.
Foi estudar música para aprender lidar um pouco melhor com a timidez, sair de casa, fazer amigos. Mas isso não aconteceu. Não fez amigos. Não ficou menos tímida. Continuava trancada em casa. Um espírito solitário, encerrado em si mesmo. Só sentia-se livre com sua flauta encostada nos lábios. Aí sua alma fluía e ela se soltava. Ótima aluna. Menos nas aulas teóricas.
Não sabia sequer o nome dele e jamais teria coragem de perguntar para alguém. Muito simples perguntar: quem é o cara? Mas não para ela. Falar com ele então...JAMAIS. Ela sentia vertigens só de imaginar o ato. Clara era muito, mas muito complicada mesmo.
Mas algo acontecia dentro dela. Clara queria aquele homem. Após mais uns tantos meses de preparo, decidiu um dia espera-lo até o fim de sua aula e puxar um assunto, perguntar a marca de seu violino, ou as horas talvez. Ela queria ouvir sua voz. Fazê-lo perceber sua existência.
No dia H, Clara pensou na roupa, no cabelo, no perfume, nas frases, no tom de sua voz, no sorriso que iria usar. Depois pensou no beijo, no cabelo dele roçando seus seios, nas mãos deslizando no seu corpo, na respiração ofegante e libidinosa dos dois entrelaçados no lençol branco de sua cama.
Terminou sua aula e postou-se corajosamente frente à escola de música, encostada à parede, perto da porta. Aguardou por quase meia hora com o estômago em frangalhos, a garganta seca, as pernas bambas, as mãos suadas, que mal amparavam a alça da bolsa numa mão e a flauta na outra.
Então, como que em câmara lenta, o viu projetando o corpo tão sonhado para fora da porta. Fora da moldura de vidro era ainda mais lindo. Alto, muito alto. A pele acetinada, morena. Os cabelos soltos. Sentiu seu corpo todo se retrair, como num espasmo. No meio de uma multidão de alunos que saíam apressados, Clara quase perdeu seu objeto de vista. Mas não. Viu-o em seguida encostado à parede, do lado oposto da que ela estava. Ela, a porta, ele.
Olhava-o de canto, sem parar de tremer, sem um mínimo movimento voluntário, rezando para todos os santos para que conseguisse. Que calmamente dirigisse a ele uma palavra que fosse. Só uma. A palavra que seria a primeira de muitas. Aquela que definiria sua vida.
E num rompante que quase travou todos os seus músculos, deu três passos na direção dele e articulou quase com desespero as primeiras palavras: “...que horas...”, embora tenha observado que ele não trazia relógio no pulso. No momento a seguir em que ela viu seus olhos pousados nela e que sua linda boca começava a articular algo, um vento varreu tudo. Inesperadamente uma mulher correu na direção dele, vinda do outro lado da rua e arremessou seu corpo de curvas perfeitas de encontro ao corpo dele, que correspondeu com um riso escancarado ao abraço sôfrego. Rodopiaram no ar, grudados, onde os cabelos longos dos dois se misturavam e onde bocas indefinidas e línguas molhadas passeavam, ardendo em desejo. Um balé de braços, pernas, beijos, cabelos, mãos, olhares e afagos.
E Clara ali, parada, a um metro da cena, com os olhos injetados e a boca crispada, imóvel. O momento descongelou-se quando ela ainda pôde ver o casal caminhando pela calçada, na direção oposta da dela, abraçados, rindo e falando alto, loucos de amor, totalmente indiferentes à presença da menina. E ainda olhou a bunda perfeita da moça rebolando em sua calça jeans muito justa.
Clara então, livrando-se da imobilidade correu, correu muito, em prantos, rasgando aos pedaços a saia nova que comprara para o encontro, tirando da boca, com as costas das mãos, o batom que pela primeira vez passara, depois de muitos anos. Naquele momento seu castelo de cristal quebrou-se. Não tinha equilíbrio para entender que aquela paixão platônica seria superada, pois como só nós sabemos, ela tinha uma cabeça muito tumultuada e não encarava as coisas como a maioria das pessoas ditas normais. Era uma obcecada.
Até que na rua transversal muito movimentada, a alguns quarteirões da escola de música, atravessando-a desarvorada, sem olhar para os lados, tomada de pânico, foi atropelada por uma moto potente. Caída na rua, ainda viva, com sua flauta na mão e um filete de sangue na boca, ainda pôde olhar, dentro de um carro estacionado, os olhos assustados de seu amor e da menina que estava com ele pousados nos dela, morrendo.
(Alessandra Mascarenhas)

domingo, 4 de maio de 2008

Amor Bastante


Quando eu vi você
tive uma idéia brilhante
foi como se eu olhasse
de dentro de um diamante
e meu olho ganhasse mil faces
num só instante
basta um instante e
você tem amor bastante
um bom poema leva anos
cinco jogando bola,
mais cinco estudando sânscrito,
seis carregando pedra,
nove namorando a vizinha,
sete levando porrada,
quatro andando sozinho,
três mudando de cidade,
dez trocando de assunto,
uma eternidade,
eu e você, caminhando junto ...
(Paulo Leminski)

sábado, 3 de maio de 2008

Sim, me leva para sempre ...

Foto: by Foguinho
Olha
Será que ela é moça
Será que ela é triste
Será que é o contrário
Será que é pintura
O rosto da atriz
Se ela dança no sétimo céu
Se ela acredita que é outro país
E se ela só decora o seu papel
E se eu pudesse entrar na sua vida
Olha
Será que ela é de louça
Será que é de éter
Será que é loucura
Será que é cenário
A casa da atriz
Se ela mora num arranha-céu
E se as paredes são feitas de giz
E se ela chora num quarto de hotel
E se eu pudesse entrar na sua vida
Sim, me leva pra sempre, Beatriz
Me ensina a não andar com os pés no chão
Para sempre é sempre por um triz
Aí, diz quantos desastres tem na minha mão
Diz se é perigoso a gente ser feliz
Olha
Será que é uma estrela
Será que é mentira
Será que é comédia
Será que é divina
A vida da atriz
Se ela um dia despencar do céu
E se os pagantes exigirem bis
E se o arcanjo passar o chapéu
E se eu pudesse entrar na sua vida...
(Edu Lobo e Chico Buarque)

Cores de Almodóvar


Eu ando pelo mundo prestando atenção
em cores que eu não sei o nome
cores de Almodóvar
cores de Frida Kahlo, cores
passeio pelo escuro
eu presto muita atenção no que meu irmão ouve
e como uma segunda pele, um calo, uma casca,
uma cápsula protetora
eu quero chegar antes
pra sinalizar o estar de cada coisa
filtrar seus graus
Eu ando pelo mundo divertindo gente
chorando ao telefone
e vendo doer a fome nos meninos que têm fome
Pela janela do quarto
pela janela do carro
pela tela, pela janela(quem é ela, quem é ela?)
eu vejo tudo enquadrado
remoto controle
Eu ando pelo mundo
e os automóveis correm para quê?
as crianças correm para onde?
transito entre dois lados de um lado
eu gosto de opostos
exponho o meu modo, me mostro
eu canto para quem?
Pela janela do quarto
pela janela do carro
pela tela, pela janela(quem é ela, quem é ela? )
eu vejo tudo enquadrado
remoto controle
Eu ando pelo mundo e meus amigos, cadê?
minha alegria, meu cansaço?
meu amor cadê você?
eu acordei
não tem ninguém ao lado
Pela janela do quarto
pela janela do carro
pela tela, pela janela(quem é ela, quem é ela?)
eu vejo tudo enquadrado
remoto controle
(Adriana Calcanhoto)

Tive sim, tive um grande Amor ...


Foto: blog Flor

Amo tua voz e tua cor
E teu jeito de fazer amor
Revirando os olhos e o tapete
Suspirando em falsete
Coisas que eu nem sei contar
Ser feliz é tudo que se quer
Ah! Esse maldito fecho eclair
De repente a gente rasga a roupa
E uma febre muito louca
Faz o corpo arrepiar
Depois do terceiro ou quarto copo
Tudo que vier eu topo
Tudo que vier, vem bem
Quando bebo perco o juízo
Não me responsabilizo
Nem por mim, nem por ninguém
Não quero ficar na tua vida
Como uma paixão mal resolvida
Dessas que a gente tem ciúme
E se encharca de perfume
Faz que tenta se matar
Vou ficar até o fim do dia
Decorando tua geografia
E essa aventura em carne e osso
Deixa marcas no pescoço
Faz a gente levitar
Tens um não sei que de paraíso
E o corpo mais preciso
Do que o mais lindo dos mortais
Tens uma beleza infinita
E a boca mais bonita
Que a minha já tocou
(Paixão - Kledir)

Sabiá



Vou voltar
Sei que ainda vou voltar
Para o meu lugar
Foi lá e é ainda lá
Que eu hei de ouvir cantar
Uma sabiá
Vou voltar

Sei que ainda vou voltar
Vou deitar à sombra
De um palmeira
Que já não há
Colher a flor
Que já não dá
E algum amor
Talvez possa espantar
As noites que eu não queira
E anunciar o dia
Vou voltar

Sei que ainda vou voltar
Não vai ser em vão
Que fiz tantos planos
De me enganar
Como fiz enganos
De me encontrar
Como fiz estradas
De me perder
Fiz de tudo e nada
De te esquecer
Vou voltar

Sei que ainda vou voltar
E é pra ficar
Sei que o amor existe
Não sou mais triste
E a nova vida já vai chegar
E a solidão vai se acabar
E a solidão vai se acabar

(Tom Jobim/Chico Buarque)

O Amor e o seu tempo



Amor é privilégio de maduros
estendidos na mais estreita cama,
que se torna a mais larga e mais relvosa,
roçando, em cada poro, o céu do corpo.

É isto, amor: o ganho não previsto,

o prêmio subterrâneo e coruscante,
leitura de relâmpago cifrado,
que, decifrado, nada mais existe

valendo a pena e o preço do terrestre,
salvo o minuto de ouro no relógio
minúsculo, vibrando no crepúsculo.

Amor é o que se aprende no limite,
depois de se arquivar toda a ciência
herdada, ouvida. Amor começa tarde.

(Carlos Drummond de Andrade)

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Mais um lamento



Por essa estrada que a ti pertence

Cada sinal, mas forte estou

Te imaginando ao lado meu

A saudade

Que graça tem esse tormento que invade

Me maltratando o coração, uma voz

Tá difícil esperar

Pra que

Tanta espera, esse aperto

Venha me trazer teu beijo

Eu to pensando em você

Repare bem

Cada minuto é importante demais

Uma fração, mais um segundo se vai

E o teu abraço aonde está

Inconseqüente

Te procurei pela cidade e gritei (eu gri-tei)

Imaginando que iria escutar

Uma reposta ao meu lamento

Pra que

Tanta espera, esse aperto

Venha me trazer teu beijo


(Eu to pensando em você - Wilson Simoninha)

Acaso

Tela - Bailarina - Claudyo Casares







Não sei se o acaso quis brincar

Ou foi a vida que escolheu

Por ironia fez cruzar

O meu caminho com o seu

Eu nem queria mais sofrer

A agonia da paixão

nem tinha mais o que esquecer

Vivia em paz, na solidão

Mas foi te encontrar

E o futuro chegou como um presentimento

meu olhos brilharam, brilharam

No escuro da emoção...


(Ivan Lins/Abel Silva)