quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Angústia

Foto: Blog 1000 Imagens
"Nada em ti me comove, Natureza, nem
Faustos das madrugadas, nem campos fecundos,
Nem pastorais do Sul, com o seu eco tão rubro,
A solene dolência dos poentes, além.
Eu rio-me da Arte, do Homem, das canções,
Da poesia, dos templos e das espirais
Lançadas para o céu vazio plas catedrais.
Vejo com os mesmos olhos os maus e os bons.
Não creio em Deus, abjuro e renego qualquer
Pensamento, e nem posso ouvir sequer falar
Dessa velha ironia a que chamam Amor.
Já farta de existir, com medo de morrer,
Como um brigue perdido entre as ondas do mar,
A minha alma persegue um naufrágio maior."

(Paul Verlaine in "Melancolia" Tradução de Fernando Pinto do Amaral)

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Nem vem que não tem!

Foto: Pierre Verger (fonte: Fundação Pierre Verger)



Nem Vem
Que Não Tem
Nem vem de garfo
Que hoje é dia de sopa
Esquenta o ferro
Passa a minha roupa
Eu nesse embalo
Vou botar prá quebrar
Sacudim, sacundáS
acundim, gundim, gundá!...
Nem Vem
Que Não Tem
Nem vem de escada
Que o incêndio é no porão
Tira o tamanco
Tem sinteco no chão
Eu nesse embalo
Vou botar prá quebrar
Sacudim, sacundá
Sacundim, gundim, gundá!...
Nem Vem!
Numa casa de caboclo
Já disseram um é pouco
Dois é bom, três é demais
Nem Vem!
Guarda teu lugar na fila
Todo homem que vacila
A mulher passa prá trás...
Nem Vem
Que Não Tem
Prá virar cinza
Minha brasa demora
Michô meu papo
Mas já vamos embora
Eu nesse embalo
Vou botar prá quebrar
Sacudim, sacundá
Sacundim, gundim, gundá!...


(Carlos Imperial - gravação Wilson Simonal)

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Canção do Suicida

Cena "Ópera Carmen (Bizet) "



Só mais um momento.
Que voltem sempre a cortar-me a corda.
Há pouco estava tão preparado e havia já um pouco de eternidade nas minhas entranhas. Estendem-me a colher, esta colher de vida.
Não, quero e já não quero, deixem-me vomitar sobre mim.
Sei que a vida é boa e que o mundo é uma taça cheia,
mas a mim não me chega ao sangue, a mim só me sobe à cabeça.
Aos outros alimenta-os, a mim põe-me doente; compreendei que há quem a despreze.
Durante pelo menos mil anos preciso agora fazer dieta.

(Rainer Maria Rilke, in "O Livro das Imagens" Tradução:Maria João Costa Pereira)